A abertura da etapa capixaba da Conferência Nacional Popular de Educação (Conape) 2018 emocionou os mais de 500 participantes presentes no auditório do Centro de Ciências Exatas da Universidade Federal do Espírito Santo (CCE/Ufes) nesta sexta-feira (23).
O encontro acontece até sábado (24) e se propõe a restabelecer a união de entidades e movimentos sociais para retomar o poder de decisão na elaboração e aplicação das políticas públicas e diretrizes relacionadas à educação básica, técnica e superior.
“Tá emocionante”, declarou Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), coordenador do Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE), professor da rede estadual de Pernambuco e um dos oradores na mesa que abriu os trabalhos do primeiro dia evento.
“A mística feita pelo MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], as falas empolgadas dos colegas, motivando o povo a manter a mobilização, a plateia atenta, motivada e disposta manter o debate após o término da conferência”, completa, satisfeito, o líder em educação popular.
O entusiasmo geral é fundamental para o encontro nacional, em Belo Horizonte/MG, nos dias 24 a 26 de maio. “Precisamos conseguir recursos para financiar a participação na etapa nacional”, conta.
O Conape em 2018 tem uma importância crucial para a continuidade da evolução democrática da educação no Estado e no país. Tanto a Conferência quanto o FNPE são uma resposta, dos movimentos sociais e entidades representativas dos educadores, à intervenção autoritária do governo federal no processo, até então democrático, de elaboração de gestão da educação no País.
Golpe
O corte aconteceu pelo governo Michel Temer, com a publicação da Portaria do Ministério da Educação (MEC) Nº 577, de 27 de abril de 2017, que desfigurou o Fórum Nacional de Educação (FNE). “Éramos 42 entidades da sociedade civil no FNE e reduziram pra 18!”, relata o presidente da CNTE.
A portaria interrompeu um processo de intensa democratização do setor e conquista de avanços históricos, iniciado em 2007, com a formação de uma comissão composta por diversas entidades da sociedade civil, o Conselho Nacional de Entidades de Base (Conae). Em seguida, a realização da Conferência Nacional de Educação (Conae), em 2008, e o financiamento público da edição de 2010.
O objetivo do governo, diz Heleno, foi impossibilitar que o debate educacional acontecesse. “Então as entidades, mantidas unidas e tendo como instrumento de mobilização a Conape, tem mantido os princípios firmados em 2007”, afirma.
Princípios, relata Heleno, que possibilitaram conquistas estruturais, como a inclusão da educação infantil, do ensino médio e profissional e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Fundo de Investimento em Educação Básica (Fundeb).
Destaque ainda para o estabelecimento do piso salarial profissional nacional para o magistério público e para a publicação da Emenda Constitucional nº 59/2009, que ampliou o direito à educação, antes restrito à faixa etária de seis a 14 anos, para quatro a 17 anos.
Além do fim da Desvinculação de Recursos da União (DRU), retomando a aplicação de 18% dos recursos totais da União na União (100% do orçamento), ao invés de 18% dos 80% restantes do orçamento, após a retirada de 20% destinados à pagamento da dívida da União. E a destinação de 10% do PIB nacional para investimentos em Educação.
“São conquistas que nos colocam na condição de ser protagonistas diretos da elaboração das políticas educacionais”, afirma, referindo-se à oportunidade conquistada de não só aplicar as políticas educacionais, mas também elaborá-las, de forma democrática, abrindo o círculo de um pequeno grupo de empresas e autoridades que desconsideram as regionalidades, as realidades e culturas distintas dos vários cantos do país.
Seguir avançando
Os próximos desafios, destaca o coordenador do FNPE, incluem aumentar a autonomia das universidades públicas e derrubar a Portaria 577/2017 e a Emenda Constitucional nº 55/2016, que, oficialmente, congelaram por 20 anos os investimentos públicos federais.
Na prática, porém, alerta o educador, a EC 95/2016 tem provocado redução dos investimentos. Na Educação, por exemplo, o orçamento de 2017 foi de R$ 6,6 bilhões, enquanto que em 2018 é de R$ 4,5 bilhões.
Se os valores se mantivessem congelados como anunciado, argumenta o educador, já haveria uma redução na prática, pois a população aumenta a cada ano e com isso aumenta a necessidade de investimentos públicos. Mas, pior do que congelados, os investimentos estão sendo reduzidos e direcionados aos grandes grupos empresariais.
“Aumentou a concentração de renda. Hoje o Brasil tem 43 bilionários e uma população pobre e miserável maior que antes”, enuncia, referindo ao governo Dilma Rousseff. E os bancos têm alcançado lucros exorbitantes, devido à escolha dos empresários privilegiados de não investirem em produção, mas sim em rendimentos, deixando o dinheiro com os bancos, provocando desemprego.
A mobilização continua, rumo à etapa nacional da Conape, em maio, e a reconquista do processo democrático, em função de mais conquistas de direitos, investimentos e oportunidades.
(Portal Século Diário, 23/03/2018)